quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Entrevista de Lars Grael para o site do VIRADÃO ESPORTIVO


Viradão Esportivo entrevista Lars Schmidt Grael, velejador brasileiro, veleja na classe Star com o proeiro Marcelo Jordão, classificando-se em terceiro lugar no campeonato brasileiro de 2006. Comandou também o barco Agripina/Asa Aluminio, campeão do Campeonato Brasileiro da Classe Oceano 2006 e continua ativo na vela .

- Como surgiu o interesse por esse esporte?


Desde que meu avô materno, que era dinamarquês, chegou ao Brasil e se encantou com a Baía de Guanabara, a vela virou uma tradição de família. Eu velejo desde que me entendo por gente e é no mar onde realmente me sinto em casa. Nossos tios Axel e Erik Schmidt foram campeões na Vela e serviram como grande inspiração para mim e meus irmãos.

- Título mais importante conquistado?

Sem dúvida, as duas medalhas olímpicas que conquistei na classe Tornado. Mas há outras conquistas que também me orgulham, como o bi-campeonato sul americano e o bronze no Mundial de 2009 da classe Star, a mais técnica e mais difícil da vela olímpica. Para mim, poder voltar a competir em alto nível depois do acidente contra os ditos "normais" é sempre uma vitória.

- Seu maior recorde?

Não sou muito ligado em recordes, mas tive o recorde do tempo corrigido da regata Santos-Rio no meu antigo barco H3+ . Dezessete títulos nacionais em classes olímpicas e panamericanas pode não ser um recorde, mas é motivo de orgulho!

- Quem é seu maior rival na modalidade?

Não tenho um rival. Somos todos amigos. Mas há sempre aqueles velejadores que, vencer, é mais difícil e, por isso mesmo, mais gratificante. Entre estes eu colocaria meu irmão Torben e o Robert Scheidt.

- Um dos momentos mais difícies da sua vida foi o acidente de 1998. Como você conseguiu superar este obstáculo?

Com muita vontade de viver, de voltar a velejar e de voltar ao convívio dos meus amigos. Superei também com o apoio e o amor da minha mulher Renata e de toda a minha família.

- Após o acidente, já pensava em voltar para o mundo dos esportes? Sentiu algum tipo de preconceito?

Na verdade, tudo que eu mais queria era voltar a navegar. Depois, naturalmente, voltei a competir. A partir daí fui progredindo e retomando a vida esportiva. Eu, talvez por ser uma pessoa pública, não sinto muito o preconceito, mas sei que ele existe contra todos os deficientes. Aliás, sempre digo que temos que mostrar que nós podemos tirar esse 'd' da palavra deficiente e mostrar para nós mesmos e mostrar para a sociedade o quanto podemos ser eficientes. Em qualquer atividade.

- Como foi ocupar cargos tão importantes no governo tais como: Secretário Nacional de Esportes no Ministério do Esporte e Turismo ? E sobre a experiência de assumir a Secretaria de Juventude, Esporte e Lazer?

Para mim, foi um desafio inteiramente diferente. Embora eu sempre tivesse um envolvimento e uma posição política, que aprendi com meu pai, nunca imaginei ocupar nenhum cargo público. Quando o presidente Fernando Henrique me convidou para fazer parte do Indesp, órgão do antigo Ministério do Esporte Turismo, já extinto, eu tinha o preconceito, como a maioria das pessoas tem, de que o serviço público era algo muito ruim. Imaginava que as pessoas que ali estavam ficavam sempre entre o descaso e a má intenção. Mas fui surpreendido por uma turma muita boa, gente muito desprendida e competente que, apesar de tudo, procura fazer o melhor. Pude ver que há um outro lado e junto com estes verdadeiros abnegados conseguimos realizar coisas boas e importantes para o esporte que estão aí até hoje.

Claro que o governo tem uma gestão muito diferente da iniciativa privada. Por vezes, é muito desgastante e frustrante ver que boas ideias se perdem no meio do caminho por questões políticas. Mas, de forma geral, foi uma experiência muito boa que pude repetir no Estado de São Paulo com o governador Geraldo Alckmin. Mas, sinceramente, não tenho a ambição hoje de voltar a nenhum governo. A política no Brasil está de um jeito que qualquer cidadão de bem fica enojado e com verdadeiro repúdio. É uma pena, pois, como falei, existem sim pessoas com espírito público e ideais elevados. Torço para que o Brasil reencontre o caminho da democracia verdadeira, com liberdade e respeito a todos os cidadãos, e que o governo possa servir mais ao coletivo e não a interesses corporativos e alheios.

- Sua filha caçula Sofia mencionou querer se tornar uma grande velejadora aos 7anos de idade, assim como alguns da família incluindo você, ela optou por esse esporte por acompanhar suas competições? Como você vê o interesse dela por essa modalidade?

Na nossa família, acredito que o interesse acaba sendo natural. Lógico que ninguém força ninguém a nada. Como nossa vida é no mar, nos clubes, nas regatas, todo nosso círculo familiar e de amizades giram em torno da Vela. Portanto, acho normal que qualquer criança que circule neste meio acabe se interessando pelo esporte. Além do mais, velejar é algo muito prazeroso, lúdico. Um esporte praticado na natureza e que não faz distinção de idade, tamanho, força ou qualquer outro pré-requisito. Basta saber nadar.

- Em sua juventude você queria ser parceiro de seu irmão a ponto de seu pai ameaçar um corte de mesada caso ele não quisesse. Seu irmão era referência pra você?

O primeiro campeonato mundial que conquistamos foi em dupla, em 1983. O Torben é mais velho que eu e sempre foi um bom exemplo para mim. Hoje ele é um dos velejadores mais completos do mundo, com medalhas olímpicas, participações em America's Cups e conquistou o último título da regata de volta ao mundo. Para mim, ele sempre será uma referência, claro.

- Você já teve diversos parceiros no esporte, já velejou com irmão, cunhado e outros. Pensa em velejar e até competir com seu filho Nicholas que já está no mundo dos esportes?

Como disse, a Vela é um esporte muito democrático. Em suas diversas categorias e modalidades há espaço para todos. Eu não só já velejei com o Nicholas, como já ganhamos algumas regatas juntos. Se um dia ele competir contra mim, e vencer, será motivo de muito orgulho, pois eu sei o quanto sou competitivo e dou trabalho aos adversários.

- Quais são seus projetos para o futuro?

Por enquanto, penso em continuar me dedicando a Vela, que é minha vida, e às palestras que sempre ajudam a levar uma mensagem legal para os diversos públicos que ouvem minha história e, de uma forma ou de outra, acabam usando algo desta minha experiência para suas vidas. Expandir as ações do Instituto Rumo Náutico (Projeto Grael) e atuar em outras ações do gênero: Instituto LiveWright e Atletas pela Cidadania, também mantém minha chama do espírito público acesa!

- Um atleta que seja referência?

Bem, como já falei, meu irmão Torben Grael. Tem também um atleta de tiro ao alvo que eu sempre relembro, o húngaro Károly Takács. Ele era sargento do exército do seu país e, mesmo sendo o melhor atirador de lá, em 1936 não pode competir na Alemanha porque naquela época só oficiais graduados podiam representar a Hungria em jogos olímpicos. Muito frustrado, ele estava treinando para os jogos de 1940, que acabaram não acontecendo por causa da 2ª Guerra Mundial, quando uma granada decepou seu braço direito. Mesmo assim, ele perseverou e aprendeu a atirar com a mão esquerda. Resultado: aos 38 anos de idade foi medalha de ouro e bateu o recorde mundial da Pistola Rápida de 25m em Londres 1948 e se tornou o primeiro deficiente a ser campeão olímpico. Em Helsinki, em 1952, ganhou outro ouro para se tornar um dos raros bicampeões olímpicos da história do tiro ao alvo. Quando o perguntaram como ele havia conseguido na mão esquerda a mesma precisão que tinha na mão direita, ele simplesmente respondeu: "eu sempre atirei com a mente e não com as mãos". Sou ainda um grande admirador de outros atletas como Zico, Adhemar Ferreira da Silva e a trina de campeões da F-1 (Fittipaldi, Piquet e Senna).

- Deixe um recado para a galera do viradão.

Que jamais esqueçam que o esporte é uma ferramenta de inclusão e de educação importantíssima. E que só o esporte consegue unir diversão garantida com competição saudável, ensinar o respeito às regras e ao adversário e a superação não do outro, mas de si mesmo.

Por: Rogerio Garcia e Daiany Dutra

Fonte: Viradão Esportivo

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